quarta-feira, 29 de julho de 2020

Grandes vultos: Martins Júnior -- Parte 12.

Martins Júnior

GRANDES VULTOS BRASILEIROS QUE MARCARAM A HISTÓRIA NAS SUAS MAIS DIVERSAS ATIVIDADES
MARTINS JÚNIOR – PARTE – 12.
Evidentemente, se o fundamento do crime fica sendo o descrédito ou a dor moral produzida no sobrevivente pela difamação do seu parente morto, – então a causa criadora e justificadora da ação criminal contra o difamador já não é a injúria produzida contra o morto, mas sim a que se produziu contra o vivo. Dá-se aí um caso de injúria indireta, que, seja como for, é sempre um crime contra pessoa viva.
A esse resultado negativo, senão absurdo, foram levados os dois referidos escritores, por não terem querido afrontar corajosamente um velho lugar comum, desses que andam a entravar a marcha das ideias e o progresso da disciplina jurídica. Diante da fórmula – só o vivo é capaz de direitos – estacaram eles como o seu patrício Dante em frente daquela lonza leggiera
Che di pel maculato era coperta.
Mas é preciso que eu diga das opiniões assentadas pelosdois juristas o mesmo que o grande poeta citado disse da inscrição exibida à porta do inferno:
Il senso lor m’e duro
E numa arrancada própria do seu temperamento:
“E se os ilustres criminalistas de que venho falando não quiserem quebrar aquele velho clichê que lhes embargou o caminho e que impediu a solução do problema, – quebro-o eu, que sei ter aquele descarado heroísmo de afirmar, de que fala um escritor moderno, e que é, quanto a mim, a condição de todo progresso intelectual.
Afirmo, pois, que, nas injúrias contra os mortos, concorrem todos os elementos jusídicos-legais, constituintes dos crimes de injúria aos vivos”.
Era assim que aquele moço de 27 anos de idade dissertava sobre a palpitante questão.
A dissertação sobre o conceito de aequitas, revela o grande romanista conhecimentos que irá ampliando e que culminará nas duas histórias do direito que nos legou.
“O estudo sobre o conceito da aequitas – escreve Rangel Moreira – é um ensaio digno de figurar entre as melhores páginas de qualquer dos grandes romanistas.”
Continua
BRASIL BANDECCHI

quarta-feira, 15 de julho de 2020

Grandes vultos: Martins Júnior -- Parte 11.


Enrico Pessina
GRANDES VULTOS BRASILEIROS QUE MARCARAM A HISTÓRIA NAS SUAS MAIS DIVERSAS ATIVIDADES
MARTINS JÚNIOR – PARTE – 11.
“Se a injúria ou calúnia foram cometidas contra a memória de um morto, o direito de queixa poderá ser exercido pelo cônjuge, ascendente, descendente ou irmãos”.
No Brasil, a questão era novidade. Mas o escritor diz logo que essa novidade é relativa, embora nunca tenha sido formulada ou discutida por juristas brasileiros.
E comenta:
“Mas a verdade, aliás pungidora do nosso amor próprio nacional, é que ela encerra uma questão conhecida desde os belos tempos da jurisprudência romana e, neste século, ruidosamente debatida em França, por ocasião do processo Rousseau-Dupan-loup”.
E lembra que da injúria aos mortos já se ocupa o “Digesto”, no título de injuriis; os Códigos Penais da Alemanha, da Áustria, da Bélgica, da Espanha, de Portugal, de Bade, de Zurique e de São Martinho e especialmente os escritores franceses e italianos. “Todas essas legislações e autores afirmam o princípio de que é crime punível e ofensa à memória dos mortos”.
Falando de Pessina e Carrara, diz que esses juristas trataram “extensa e proficientemente da injúria dos mortos”, e que eles resumem, com brilhantismo, tudo o que os demais escritores possam ter dito relativamente à matéria. Cita trechos que evidenciam o pensamento de Carrara no “Programa del corso di Diritto Criminale” (parte especial. Vol. 3º. Página 210) e Pessina em “Elementi Del Diritto Penale” (Vol. 2º. Página 137).
Feito isto, faz este comentário que mostra bem o seu modo de enfrentar o problema:
“Vê-se que estes dois ilustres tratadistas fazem consistir o crime de injúria a um morto numa lesão ao direito de um vivo. Segundo eles, toda vez que há difamação de pessoa falecida, os herdeiros legítimos dessa pessoa são de algum modo feridos na sua reputação ou no seu afeto, e daí lhes vem o direito de chamar a juízo o difamador.
Evidentemente, esta compreensão do crime de que me ocupo é vacilante e filha de um prejuízo. Compreende-se logo que Pessina e Carrara, reconhecendo não existir crime sem lesão de um direito preexistente, e não querendo buscar esse direito na memória do morto, procuram elidir a dificuldade pedindo a um direito do sobrevivente o fundamentum criminis que o processo não lhes podia dar.
Eu, porém, é que não me conformo com esse modo de ver, e repito que ele é filho de um prejuízo. Com a solução que apresentam os dois professores italianos, a questão não fica resolvida, ou fica resolvida em sentido contrário.
Continua
BRASIL BANDECCHI

quarta-feira, 1 de julho de 2020

Grandes vultos: Martins Júnior -- Parte 10.

Francesco Carrara

GRANDES VULTOS BRASILEIROS QUE MARCARAM A HISTÓRIA NAS SUAS MAIS DIVERSAS ATIVIDADES
MARTINS JÚNIOR – PARTE – 10.
O ensaio o “Crime de injúria aos mortos” foi publicado no Recife, em 1891, num livro intitulado “Fragmentos jurídicos-filisóficos” que enfeixava, além do citado ensaio, ainda “O conceito da aequitas”, “Função histórica da Economia Política”, “Intuições romana e germânica do processo” e “Sociologia e Sociólogos”.
Em pós-escrito, declara:
“As páginas que o leitor acaba de percorrer contêm, como indica o respectivo título geral, uma série de trabalhos diversos, escritos em épocas diferentes, e por isso mesmo sem outra ligação entre si, a não ser o comum espírito filosófico que os anima e a tendência, neles revelada, de insuflar no organismo do nosso Direito um pouco de salutar oxigênio que forma a atmosfera da atual concepção positiva do mundo.
Fossem esses trabalhos realizados em circunstâncias diferentes, fora das condições excepcionais e difíceis em que tiveram de ser executados, sem a pressão do assunto imposto e do tempo limitado pelas exigências regulamentares dos concursos oficiais, eu os teria apresentado, senão melhores, ao menos mais detalhados, mais desenvolvidos e mais cuidado no fundo e na forma.
Fosse por outro lado, o presente livro um complexo de estudos, feitos maduro e longamente na calma do gabinete, com a livre escolha dos assuntos explanados, em muito maior número, e muitos outros seriam os trabalhos apresentados hoje ao leitor”. O trabalho sobre a injúria aos mortos é de 1887, embora publicado em 1891, era matéria nova entre os juristas brasileiros. Martins Júnior não só desenvolve o tema inteligentemente como, também, defende tese contrária à opinião de quantos escritores se haviam ocupado do assunto. Carrara e Pessina são baluartes da corrente contra a qual Martins Júnior iria lançar a força dos seus argumentos.
Fixemos bem. Neste ano de 1887, Martins Júnior contava 27 anos de idade. Parece-me importante esta lembrança, porque desde essa época já mostrava sólida e robusta cultura, a qual irá aparecer em toda sua plenitude na “História Geral do Direito” e na “História do Direito Nacional”. Nesse ano de 1887, vigorava o Código Penal Brasileiro de 1831 e nada havia sobre a injúria aos mortos, o que só passou a ser matéria criminal em 1890, com o novo código, onde o artigo 324, estatuía:
Continua
BRASIL BANDECCHI
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