quarta-feira, 23 de junho de 2021

Os Sertões.


GRANDES VULTOS BRASILEIROS QUE MARCARAM A HISTÓRIA NAS SUAS MAIS DIVERSAS ATIVIDADES

EUCLIDES DA CUNHA – Parte 05.

Euclides da Cunha regressou de Canudos e foi, em 1898, dirigir a reconstrução de uma ponte na cidade paulista de São José do Rio Pardo. Nessa cidade, encontrando ambiente propício, calma, compreensão de amigos, começou a escrever e concluiu o seu livro mais importante, ponto basilar de toda a sua obra e uma das mais importantes contribuições feitas por um escritor à cultura nacional: Os Sertões.

A obra, publicada em dezembro de 1902, elevou, de chofre o seu autor a um nível dos mais distinguidos entre os escritores do Brasil.

Divide-se em três partes: “A terra”, “O Homem” e “A Luta”. Na primeira parte, o autor procura estudar o esqueleto geológico e geográfico da área do sertão, a influência do meio físico, o clima da região, a sua flora, tarefa que foi facilitada pela sua qualidade de geógrafo. Traçou as coordenadas de uma teoria geográfica que, embora atualmente superada, ainda tem os seus seguidores. No entanto, muito do que Euclides da Cunha escreveu na primeira parte do seu livro ainda resiste. Um especialista como Aroldo de Azevedo escreveu sobre a primeira parte da sua obra: “façamos, pois, rigorosa justiça a Euclides e proclamemos mais esta valiosa faceta de sua obra-prima: nos seus capítulos preliminares, nada existe que possa assemelhar-se ao sistema então geralmente aceito, de dividir a matéria naqueles clássicos e bolorentos itens: orografia, geologia, potamografia, limonografia, climatologia, riquezas naturais, etnografia… Leem-se hoje as páginas de Os Sertões, sentindo-se o mesmo bem-estar que nos proporcionam as páginas de um moderno geógrafo, se as encaramos sob o ponto de vista exclusivamente de método.”

Na segunda parte do livro, procura traçar uma visão dos nossos tipos regionais, focalizando o problema do caldeamento das diversas raças que formaram a base antropológica das diversas áreas, especialmente a sertaneja. Analisa, também, a diferenciação que se operou entre o mestiço do sertão, isolado, e o do litoral, em contato com outras raças, etnias e culturas. Intoxicado de teorias que endossavam a existência de raças superiores e inferiores, Euclides da Cunha, embora emitindo conceitos atualmente inaceitáveis, procura estabelecer, pela primeira vez, as características dos diversos tipos regionais do Brasil, sendo chamado, por isso, por Artur Ramos, um dos seus mais severos críticos, de “fundador de nossa antropologia regional”. Finalmente, a última parte do livro – “A Luta” – narra os lances da tragédia de Canudos, as diversas expedições militares que foram organizadas pelo governo da República, o fanatismo dos adeptos de Antônio Conselheiro, líder dos camponeses sublevados e a vitória das forças legais.

Continua

CLÓVIS MOURA

quarta-feira, 9 de junho de 2021

Grandes vultos: Euclides da Cunha - Parte 04.

 

GRANDES VULTOS BRASILEIROS QUE MARCARAM A HISTÓRIA NAS SUAS MAIS DIVERSAS ATIVIDADES

EUCLIDES DA CUNHA – Parte 04. 

Na série de correspondência que enviou podemos notar a transformação do seu pensamento em contato com os problemas e a realidade da região conflagrada. Os artigos vão adquirindo cada vez tons mais sombrios, à medida que Euclides da Cunha chega ao local da revolta e toma contato com a realidade da vida sertaneja. Ante o desfilar macabro dos prisioneiros que seriam depois degolados, começa a ver e admirar o heroísmo dos jagunços, afirmando que “custa a compreender a energia soberana que os alevanta por tal modo acima das imposições mais rudes da matéria”; percorre as casas de Canudos, já nas mãos das tropas legais, e se estarrece ao ver a miséria em que vivem os nossos irmãos, descrevendo-a com a força que somente a revolta produz: “compreende-se que haja povos vivendo ainda, felizes e rudes nas anfractuosidades fundas das rochas; que o caraíba ferocíssimo e aventureiro se agasalhe bem nas tubanas de paredes feitas de sebes entrelaçadas de trepadeiras agrestes e tetos de folhas de palmeiras ou caucásios nas suas burcas cobertas de couro – mas não se compreende a vida dentro dessas furnas sem ar, tendo por única abertura, às vezes, a porta estreita da entrada e cobertas por um teto maciço e impermeável de argila sobre folhas de icó!”

Em seguida, descreve a mobília que é, aliás, o mobiliário clássico das casas camponesas: “um banco grande e grosseiro (uma tábua sobre quatro pés ou torneados); dois ou três banquinhos; redes de cruá; dois ou três baús de cedro de três palmos por dois. É toda a mobília. Não há camas; não há mesas; de modo geral…”

Finalmente, já em correspondência datada de primeiro de outubro, confessa: “sejamos justos – há alguma coisa de grande nessa coragem estoica e incoercível, no heroísmo soberano e forte dos nossos rudes patrícios transviados e cada vez mais acredito que a mais bela vitória, a conquista real, consistirá no incorporá-los, amanhã, breve, definitivamente, à nossa existência política.”

Continua

CLÓVIS MOURA

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