quarta-feira, 25 de julho de 2018

Grandes vultos: José do Patrocínio - Parte 09.


Apresentação alegórica no Teatro Lucinda em 13 de maio de 1902, comemorando a abolição da escravatura no Brasil
  GRANDES VULTOS BRASILEIROS QUE MARCARAM A HISTÓRIA NAS SUAS MAIS DIVERSAS ATIVIDADES
JOSÉ CARLOS DO PATROCÍNIO – PARTE 09.
Parece que o vaticínio estava escrito no livro do destino.
O libertador não admitia a ideia de proclamação da república antes da libertação e tinha conceitos lapidários como este: “que adianta uma república com milhões de escravos?”
Entretanto, os republicanos, tendo à frente Silva Jardim, não lhe perdoavam esta atitude. Certo dia, no auge da campanha, defrontaram-se os dois tribunos no Teatro Lucinda. Silva Jardim, com seu verbo inflamado, acusava-o de traição à causa: “o cativo de um beijo com que a princesa ameigara o filho”. Quando chegou a sua vez de falar, pronunciava palavras trôpegas, tímidas, num ambiente carregado. Seus amigos previram seu fracasso. Paula Nei, artimanhoso, misturou-se à multidão e soltou um desaforado aparte:
– “Cala a boca, negro!”
A injuria foi uma tremenda punhalada no coração do tribuno. Súbito o mesmo se recompõe e começa uma oração fulminante. Dos apupos que havia recebido antes, o povo passa às palmas. Sua vitória estava assegurada com o delírio final do povo o ovacionando sem cessar.
Na redação do jornal “Cidade do Rio”, o velho amigo que o aparteou, acabou confessando seu crime, que visou salvá-lo do abismo, pois, somente espicaçado, Patrocínio saía-se das enrascadas. Foi como se despertasse um titã.
Por causa do seu temperamento emocional, numa constante vivência de entrechoques, não conhecia amigos se estes se colocavam contra a causa redentora, sua obsessão. Tudo o mais era para ele secundário. Era tomado de um furor negro e quando lhe ressalvavam suas aparentes contradições, dizia aos amigos: “Sou filho de um padre com uma preta. Às vezes fala em mim a eloquência do padre; outras vezes, a língua da preta.”
Continua…
S. SILVA BARRETO

quarta-feira, 11 de julho de 2018

Grandes vultos: José do Patrocínio - Parte 08.


GRANDES VULTOS BRASILEIROS QUE MARCARAM A HISTÓRIA NAS SUAS MAIS DIVERSAS ATIVIDADES
JOSÉ CARLOS DO PATROCÍNIO – PARTE 08.
A festa da abolição durou 8 dias. José do Patrocínio foi alvo das mais diversas manifestações. O povo, em delírio, o carregava, tirava-lhe, como “souvenir”, botões de sua casaca, pedacinho de sua camisa, chegando, segundo relato de historiadores, a deixá-lo em frangalhos. No fim da semana de delírios populares, foi ele convidado pela mocidade acadêmica de S. Paulo para receber da mesma a homenagem merecida onde foi recebido em triunfo com a maior festa que a pauliceia tributava a um homem até então. “Foi carregado, abraçado e beijado pelos moços em delírio”. Conduzido ao Grande Hotel, onde todos esperavam ouvir sua palavra. Contudo, o herói do dia estava indisposto e cansado de tanta festa em que ele era a principal figura. Havia pronunciado naqueles dias mais de cem discursos e estava esgotado. Ao começar seu discurso, embora belo, arrastava-se sem um fecho de ouro, tornando-se interminável e monótono quando, então, o conhecido e notável satírico da época, Herculano de Freitas, puxou-lhe a aba da sobrecasaca e lhe sussurrou:
– “Fala em José Bonifácio… e acaba com isto”.
Patrocínio recebeu a sugestão de Herculano como uma tábua de salvação e se saiu muito bem, terminando sua oração por convidar o povo a ir com ele ao cemitério da Consolação e rezar pela liberdade. Este final salvou o resto do discurso, pois o povo, eletrizado, carregou o tribuno até o cemitério. Terminada a fase da abolição, Patrocínio se colocou em posição discreta, pois entendia que o terceiro reinado, com a Princesa Redentora, se tornara um imperativo de gratidão do povo brasileiro a Isabel, que lhe dera a lei Áurea, ainda que advertida por Cotegipe de que a libertação significaria a queda da coroa. Patrocínio colocou-se, então, numa espécie de dualismo político que seus amigos não compreendiam e seus inimigos criticavam. Era um dos primeiros republicanos, mas, ao mesmo tempo, grato a sucessora de D. Pedro II. Viu-se rodeado de inimigos ferozes, que não o perdoavam. João Marques, um de seus maiores amigos, na memorável noite de 13 de maio, em que o povo, alta madrugada, gritava pelas ruas incessantemente, seu nome, “Patrocínio!” “Patrocínio!”. “Viva Patrocínio”, vaticinou enfaticamente:
– “Que belo dia para morreres José! Nunca mais encontrarás outro igual!” e, completando seu pensamento, terminou:
– “Vais viver, meu velho, e vais para a política… e aquilo emporcalha, meu amigo!”.
Continua…
S. SILVA BARRETO
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